“Pessach”, em hebraico, quer dizer “passagem”. Na comunidade judaica, é o nome da chamada festa da libertação e sua data marca o fim da escravidão dos judeus no Egito – mais especificamente, tem início no dia em que houve a execução da décima praga junto aos egípcios. Liderados pelo profeta Moisés, imortalizado pelo ator Charlton Heston no filme “Os Dez Mandamentos”, os judeus saíram da servidão e rumaram pelo deserto em direção à Terra Prometida. Já a Páscoa, comemoração cristã que ocorre na mesma época, marca a crucificação, morte e ressurreição de Cristo.
Estamos no meio da pandemia do coronavírus e, segundo as autoridades, ainda não chegamos no auge do contágio e de suas consequências nefastas. Em isolamento social, passamos por essa situação durante uma data cheia de significados.
Como diz a tradução da palavra hebraica que motivou essa comemoração anual, o momento é de passagem. Depois do coronavírus, a vida não será a mesma antes. Nossas atitudes serão diferentes e muitas convicções pessoais vão mudar. Novos hábitos vão ser incorporados ao nosso cotidiano e haverá um legado econômico a resolver quando a quarentena acabar. Portanto, vivemos uma transição. E não temos ideia do que nos aguarda – é o caminho para um futuro totalmente incerto.
Outro sentido do Pessach é o da libertação. O que isso tem a ver com o momento? Talvez estejamos iniciando uma fase na qual teremos de nos libertar da falta de paciência que nos acorrenta. O mundo no qual tudo tinha de ser imediato parou. E precisa se reinventar para seguir em frente. O comportamento, o jeito de fazer negócios, a comunicação – tudo está passando por um processo de transformação instantânea. Estamos nos libertando de um modelo antigo para ingressar em um novo padrão. Será esse futuro melhor ou pior? Ninguém sabe. Mas é um rompimento que precisamos aceitar. O final do isolamento vai trazer um legado e precisamos nos preparar para isso.
Por fim, outra imagem que é frequentemente associada a este período é a de Jesus Cristo. Na tradição cristã, o período de quinta-feira a domingo representa a chegada do Nazareno a Jerusalém, a ceia com os apóstolos e sua prisão. Depois, crucificação, morte e ressureição. O calvário de Cristo é uma metáfora perfeita para a intolerância. Mostra com clareza como uma mensagem de paz foi interpretada com intransigência e brutalidade.
É o caso de pensar: estamos ouvindo os demais com atenção? Ou simplesmente queremos impor nosso ponto de vista? O isolamento criou um estresse único, que multiplicou a “tolerância zero” que está dentro de nós. O exemplo da Páscoa nos motiva a ser flexíveis. Se tudo mudou, teremos de nos adaptar ao que o futuro nos reserva. E, neste caso, não adianta argumentar com a realidade que se impõe. Pode-se lutar para transformá-la ou melhorá-la. Mas não se discute com a recessão econômica ou com a falta de saúde – é preciso agir contra essas ameaças. Melhor agirmos unidos do que em dois ou três grupos, que esbravejam entre si.