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O Brasil precisa de um Tancredo Neves

Muitos acham que o Centrão é um fenômeno recente. Mas ele remonta ainda a fase final do governo militar, especialmente após o final do bipartidarismo que extinguiu a Aliança Renovadora Nacional (Arena) e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB, em sua primeira encarnação). Na virada de 1979 para 1980, alguns partidos foram criados. A Arena se transformou em PDS e o MDB virou PMDB. À esquerda surgiu o Partido dos Trabalhadores. E, disputando o legado de Getúlio Vargas, vieram o Partido Trabalhista Brasileiro, liderado por Ivete Vargas (sobrinha de Getúlio) e o Partido Democrático Trabalhista (PDT), de Leonel Brizola. Destes, aos trancos e barrancos, ainda existem o MDB, o PT, PTB e PDT.

Mas uma outra agremiação viria ser uma espécie de embrião do grupo de moderados que sempre flutuaria em torno do poder – algo que foi se transformando até chegar ao Centrão que conhecemos hoje. Esses moderados se reuniram em torno de Tancredo Neves e fundaram o Partido Popular, egressos da Arena e do MDB.

Tancredo enxergou, com alguns anos de antecedência, que a ditadura não teria forças para se estender após o mandato de João Figueiredo, que se encerraria em março de 1985. E trouxe correligionários que tivessem duas características principais: que fossem centristas e tivessem vocação de orbitar em torno do poder. Isso soa familiar?

O PP, no entanto, não teve musculatura para ganhar protagonismo e derrotar o PDS, que ainda era maioria no Congresso (naquela época, a eleição presidencial era indireta e os votos eram dados pelos parlamentares das duas casas). Além disso, o governo impôs ao Congresso uma regra que impediria coligações partidárias nas eleições de 1982. Tancredo, sempre pragmático, procurou Ulysses Guimarães e propôs uma fusão partidária, com um olho no governo de Minas Gerais no curto prazo e na presidência em 1985.

O Centrão antigo iria ganhar um novo impulso em 1984, logo depois que a emenda Dante de Oliveira, promovendo o retorno das eleições diretas, foi rejeitada pelo Parlamento. O então presidente do PDS, José Sarney, queria prévias para definir o candidato do partido, que estava dividido; Figueiredo queria que Mario Andreazza, um de seus ministros, disputasse o Planalto. Mas Paulo Maluf atropelou-o e quis impor sua candidatura (o que conseguiria mais tarde). As prévias foram descartadas e Sarney abandonou o PDS.

Era tudo o que Tancredo desejava. Trouxe Sarney para o PMDB e o colocou como vice em sua chapa. A dupla, ainda, articulou uma forte dissidência dentro do PDS, que ganhou a alcunha de “Frente Liberal”. Quando chegou a eleição indireta, foi uma lavada: Tancredo obteve 480 votos contra 180 de Maluf (houve 26 abstenções, quase todas do PT).

Sem a Frente Liberal, essa vitória, que enterrou de vez a ditadura militar, não seria possível (em março de 1985, esses dissidentes e outros moderados do PMDB se reuniriam no Partido da Frente Liberal, o PFL).

Como se vê, o grupo que tem Arthur Lira como um de seus líderes, é bastante antigo e sempre esteve próximo ao Planalto, negociando cargos e salários em troca de apoio. Quando olhamos para o cenário político nos últimos 40 anos, podemos enxergar inúmeras situações que são parecidas com o quadro atual de fisiologismo.

Infelizmente, não temos nenhum político que se assemelhe – nem ao menos remotamente – com Tancredo Neves. Tancredo tinha qualidades que seriam importantíssimas para o Brasil polarizado de 2023: era moderado e mantinha as emoções controladas por uma coleira bastante firme. E possuía uma capacidade gigantesca de aglutinar apoios sem prometer muito em troca. Foi uma das últimas raposas felpudas de nossa política, capaz de seduzir inimigos com sua lábia e fortalecer os laços com seus apoiadores.

Se tivéssemos alguém como Tancredo, a polarização política brasileira estaria com seus dias contados – e a instabilidade que cerca as relações entre Planalto e Congresso diminuiria significativamente. Como ninguém é perfeito, ele era um seguidor de John Maynard Keynes e acreditava piamente em um papel preponderante do Estado na busca pelo crescimento do Brasil.

Em sua defesa, pode-se dizer que sua geração foi bem mais impactada pelo keynesianismo do que pelas ideias de Ludwig Von Mises. E que, talvez, ele pensasse diferente se vivesse no mundo de hoje.

Seus ensinamentos políticos, porém, são preciosos e poderiam iluminar lulistas e bolsonaristas. “O Brasil dos nossos dias não admite nem o exclusivismo do governo nem da oposição. Governo e oposição, acima dos seus objetivos políticos, têm deveres inalienáveis com o nosso povo”, disse ele em 1977.

“De Norte a Sul do Brasil, estou pregando, em praça pública, a unidade nacional. Prego a concórdia, a construção do futuro, e não me prendo aos pesadelos do passado”, afirmou Tancredo em 1984. Essa frase precisa fazer escola e estar na cabeça dos políticos em 2026.

O Brasil, mais do que nunca, precisa de um Tancredo Neves.

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