Todos já viram essa situação de perto. O chefe quer demitir o subordinado, mas não quer arcar com os custos financeiros de sua exoneração. Então, transforma a vida do funcionário em um verdadeiro inferno, para que ele peça para sair. O contrário também ocorre: alguém quer sair de uma empresa, mas não quer pedir demissão. Começa, então, a agir de forma agressiva e crítica em relação à chefia, para cavar um bilhete azul e levar seus direitos trabalhistas para casa.
Essas duas situações, que ocorrem frequentemente no mundo privado, têm equivalência no conflito entre o presidente Jair Bolsonaro e o Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Vamos esquecer por um instante de quem é a culpa deste embate – ou ainda qual dos dois tem razão em relação ao método de combate à pandemia do coronavírus.
O fato é que Bolsonaro quer Mandetta fora. Mas, para não se desgastar politicamente, prefere que o ministro se demita. Já Mandetta não quer pedir demissão, mas está desconfortável com a falta de sintonia com o presidente e fica mandando recados pela imprensa, provavelmente forçando uma exoneração.
Quem está certo? Nenhum dos dois.
Se Bolsonaro quer imprimir uma direção diferente em relação à pandemia, que o faça. Ele tem o mandato para isso. Haverá consequências políticas? Sem dúvida, pois é enorme o contingente de pessoas que prefere medidas mais fortes de isolamento social e retardar a volta ao trabalho. Do outro lado do ringue: Mandetta quer sair? Que saia. Ou fique sem balançar o barco. A entrevista concedida no último domingo foi uma provocação ao mandatário, que lhe custou o apoio dos militares à manutenção de seu cargo.
O país assiste a um combate verbal inusitado: quem tem o poder para demitir não o exerce. Quem pode assinar uma carta de demissão não o faz.
Mais uma vez, estamos diante de um jogo de xadrez disputado: os dois polos ficam encastelados cada um em seu lado, esperando o que o outro lado vai fazer. Enquanto isso, o país aguarda. Nem o presidente faz o que deseja fazer nem o ministro se sente autorizado a ir em frente em suas convicções. Ou seja, ficamos imobilizados num momento em que precisaríamos de agilidade e carta branca ao titular da Saúde. Até quando perderemos tempo com embates inúteis?