Uma nova e discreta crise institucional fermenta desde maio em Brasília, opondo o Planalto e a comunidade militar de inteligência depois que a licitação para a aquisição da ferramenta de monitoramento e espionagem eletrônica Pegasus sofreu uma tentativa de ingerência do vereador carioca Carlos Bolsonaro (Republicanos), filho (imagem) do presidente. Carlos 02 não possui nenhuma atribuição ou responsabilidade legal na questão e entrou nessa só de metido. Para complicar, há um desdobramento internacional que só ganha volume. No domingo (19), alguns dos principais jornais dos Estados Unidos e Europa noticiaram que o Pegasus, de origem israelense, foi usado para espionar o trabalho de jornalistas. De acordo com The Washington Post, The Guardian e Le Monde, cerca de 50 mil números de telefone foram alvos da arapongagem global de dados.

Isso não significa que todos foram hackeados, mas na lista de 180 dispositivos de profissionais de imprensa está gente da CNN International, The New York Times, Bloomberg, The Economist, Reuters, Al-Jazeera, El País e The Wall Street Journal que atua em países instáveis e que suprimem a liberdade de imprensa, como Arábia Saudita, Azerbaijão, Bahrein, Cazaquistão, Emirados Árabes Unidos, Hungria, Índia, México e Marrocos.
No Brasil, a tentativa do filho do presidente foi criticada pelos militares. O Gabinete de Segurança Institucional (GSO) e Agência Brasileira de Inteligência (Abin), órgãos legalmente constituídos que podem utilizar esse tipo de equipamento, junto com Polícia Federal, ficaram de fora da operação de compra, ainda não concluída. A licitação que atiçou Carlos Bolsonaro e descontentou os militares pela intromissão é a de nº 03/21, do Ministério da Justiça, no valor de R$ 25,4 milhões. É mais um prato cheio para uma investigação contra os Bolsonaro.
Ameaças à liberdade
“As revelações sobre a aparente utilização generalizada do software Pegasus para espionagem de jornalistas, defensores dos direitos humanos, políticos e outros numa variedade de países são extremamente alarmantes e parecem confirmar alguns dos piores receios sobre a potencial utilização abusiva da tecnologia de vigilância para minar ilegalmente os direitos humanos”, afirmou Michelle Bachelet, alta comissária da ONU para Direitos Humanos e ex-presidente do Chile. Ela sabe dos riscos envolvidos. Na ditadura Pinochet, seu pai, o brigadeiro Alberto Bachelet, morreu de ataque cardíaco após sofrer brutais torturas na prisão. Ela explicou que esse tipo de tecnologia está ligada à intimidação e mesmo assassinato de jornalistas e defensores de direitos humanos.