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O perfil dos novos empreendedores – versão pós-pandemia

Um artigo publicado nesta semana no Wall Street Journal mostra que o número de empreendedores cresceu avassaladoramente nos Estados Unidos desde o início da pandemia. Foram registradas 4,54 milhões de novas empresas nos EUA entre janeiro e outubro de 2021, um aumento de 56 % em relação ao mesmo período de 2019. Ao contrário do que se possa imaginar, esses novos empreendedores não abraçaram a livre iniciativa porque foram demitidos de seus empregos. Na verdade, está acontecendo o contrário: os americanos, de todas as faixas etárias, estão pedindo demissão para abrir seus próprios negócios.

Há vários de tipos de empreendedor – mas, geralmente, existem duas categorias que prevalecem neste nicho. Um é aquele que sempre teve vocação para ter o próprio negócio, mostrando tino comercial desde a infância. Outro é aquele que empreende por pura necessidade, abraçando um empreendimento apenas quando viu esgotadas suas chances de obter um holerite.

Sou empreendedor desde 2009. E, apesar dos perrengues típicos do mercado brasileiro, não me arrependo. Naquele momento, tinha pouco mais de quarenta anos. Meus últimos empregos tinham sido como diretor de redação de uma revista semanal e vice-presidente de uma agência multinacional de propaganda. Olhei para o futuro e constatei que seria cada vez mais difícil me manter em posições semelhantes – pois no topo da indústria de comunicação há pouquíssimas vagas. Nessa hora, minha conclusão foi a de que a idade jamais seria um problema se eu tivesse meu próprio negócio. Foi assim que comecei. Mas, no início, foi muito duro e pensei em desistir duas vezes, quando recebi propostas tentadoras de trabalho.

O que se observa agora nos Estados Unidos – e aqui também no Brasil – é um fenômeno totalmente diferente. Os novos empreendedores não necessariamente sonharam em ser seus próprios patrões desde crianças. Ou ficaram desempregados e viram a livre iniciativa como a única alternativa que restou. Ou acharam que o caminho do empreendedorismo seria uma forma de driblar uma aposentadoria forçada, como eu. O que vemos é gente empreendendo porque deseja ter horários mais flexíveis e quer estar mais com a família.

Trata-se de uma motivação inédita. E tem muito a ver com o comportamento da nova geração. O que se percebe, porém, ao ler as opiniões de especialistas e os casos relatados na reportagem do WSJ é que esta tendência está presente em todas as faixas etárias. Ou seja, está mais para um “Zeitgeist” (espírito dos tempos atuais) do que de uma atitude geracional.

É interessante também observar que, até recentemente, os empreendedores percebiam oportunidades e montavam suas empresas se adaptando às nuances de um determinado mercado. O que se percebe atualmente é que os empresários dessa nova cepa fizeram um movimento contrário: eles querem que seus clientes se adaptem às suas necessidades, como o horário flexível.

Em alguns nichos de mercado, isso é totalmente possível – especialmente nas funções mais voltadas para a tecnologia, ou que não necessitem de um forte convívio com empresas e seus representantes. Contudo, há outros setores que precisam de uma presença constante do empreendedor na condução do business ou mesmo junto aos clientes (esses setores não devem interessar os “neoempreendedores”).

Os representantes da geração baby boomer, com um olhar mais preconceituoso, veriam com reservas esse movimento. E avaliariam que empresas que nascem sob a égide do horário flexível estão fadadas a ser pequenas. Por quê? Bem, empreendedorismo é a arte de se sacrificar em nome de um projeto, de uma ideia. Nem todos os empreendedores estão nessa vida apenas para enriquecer. Muitos se preocupam em deixar um legado para as próximas gerações – e, por legado, não se entenda herança monetária.

Quando estabelecemos barreiras na forma de horários flexíveis, teoricamente estamos criando limites de quanto podemos trabalhar dentro de um dia. Isso pode ser letal para o crescimento de um negócio. Neste sentido, lembro da conversa que tive, anos atrás, com um grande consultor de empresas familiares, que fora convidado para trabalhar no processo de sucessão de uma grande companhia.

Depois de muito conversar com o fundador, foi bater um papo com herdeiros e herdeiras. Tomou um susto quando escutou uma das filhas do empresário desabafar: “Parece até que o papai gosta mais da empresa do que de mim”, disse ela. O consultor, então, retrucou:

– Minha filha, você também precisa entender o lado de seu pai. Para fazer você, ele precisou de sua mãe. Para fazer a empresa, ele dependeu apenas dele mesmo.

Depois dessa manifestação explícita de sinceridade, meu amigo foi dispensado do projeto. Mas ele acabou tocando em um ponto importante. Os grandes negócios familiares, cuja origem está em empreendimentos pequenos, foram construídos a partir de muito suor, dedicação e privação de momentos de lazer ou com a família.

Será que esses novos empreendedores, que estão em busca de horários flexíveis, vão continuar assim? Ou serão tomados pela febre do empreendedorismo, levando-os a uma agenda ainda mais frenética do que na época do contracheque?

Essa é uma boa pauta para daqui a dois anos, quando saberemos se esses novos empreendedores conseguiram se manter fiéis às propostas originais de seus negócios ou não. Por enquanto, fica aqui a minha dúvida sobre se essas iniciativas vão sobreviver às demandas de mercado.

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