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Um Coppola que vale a pena ser revisitado

Outro dia, eu e um amigo comentamos um filme que nos marcou nos anos 1980 – “O Selvagem da Motocicleta” (“Rumble Fish”, que quer dizer “peixe de isca” ou “peixe de briga”). Coincidência ou não, logo depois dessa conversa, a Apple TV colocou essa película à venda em seu acervo online – e pode ser uma ótima opção para este sabadão.

Trata-se de uma pequena obra prima de Francis Ford Coppola, que ficou ofuscada por várias realizações mais famosas do cineasta, como “O Poderoso Chefão” e “Apocalipse Now”. O roteiro, baseado em um livro da escritora S.E. Hilton (que faz uma ponta no filme como uma prostituta que aborda os personagens principais), é primoroso e mostra o cotidiano de alguns jovens em Tulsa, Arizona, em especial dois irmãos: Rusty James (Matt Dillon) e “Motorcycle Boy” ou “O Motoqueiro” (Mickey Rourke).

O título em português não faz muito sentido. O papel de Rourke é o de um beatinik que se arrepende do passado violento e quer apenas a pacificação entre as gangues de jovens. Ele é daltônico e um pouco surdo, “como uma televisão em preto e branco, com o volume baixo”. É por isso que todo o filme não foi rodado em cores, para dar a perspectiva daquele que seria seu narrador.

Há apenas alguns momentos em que se vê cores. O primeiro: quando os peixes que são referência do título são mostrados. Esses animais brigam entre si dentro de um aquário – e, quando confrontados com a própria imagem no espelho, batem contra o vidro do aquário até à morte. Rourke diz que, se os peixes estivessem em um rio, livres, não brigariam. É uma metáfora para os adolescentes que apenas se agridem porque se sentem presos em seus cotidianos.

O outro instante em que se vê alguma cor é no momento em que Matt Dillon é capturado pela polícia e vê seu próprio reflexo (colorido) no vidro da viatura. Como se fosse um peixe de briga, ele se irrita e começa a socar o vidro, até quebrá-lo.

Não espere um ritmo frenético. A cadência é lenta, mas há um casamento perfeito entre as imagens gravadas por Coppola e a trilha sonora de Stewart Copland (ex-baterista da banda The Police). Há várias cenas que parecem ter sido baseadas em “Koyaanisqatsi”, um filme minimalista que fora produzido por Coppola no ano anterior. As imagens mostram o passar do tempo, como sombras se movimentando na parede e nuvens se mexendo no céu. E vários relógios são vistos ao longo dos 94 minutos de exibição.

A ideia é mostrar como os jovens têm à disposição todo o tempo do mundo. Como diz o personagem do músico Tom Waits, Benny: “Tempo é uma coisa engraçada. É um item muito peculiar. Veja, quando você é jovem, você é um garoto, você não tem nada além de tempo. Você joga fora um par de anos aqui, mais um par de anos ali… Isso não importa, sabe? Quando você fica mais velho, acaba pensando: ‘Nossa, qual é a minha idade? Eu tenho trinta e cinco verões para desfrutar’. Pense nisso. Trinta e cinco verões”. Curiosamente, Waits tinha exatamente trinta e cinco anos de idade durante a filmagem de “Rumble Fish”.

O filme foi gravado logo em seguida de “Vidas Sem Rumo” (“Outsiders”), também baseado em um livro de Hilton sobre adolescentes e que contava com o mesmo Dillon e também Diane Lane no elenco. A trama gira em torno de um rapaz que não foi privilegiado pela inteligência (Rusty James) e que vive à sombra do irmão, considerado um líder sagaz e elegante. Apesar de suas limitações intelectuais, ele percebe o destino do primogênito e tenta impedi-lo de tentar um encontro marcado com a tragédia.

Coppola consegue imprimir uma narrativa sensível dentro de um ambiente violento e miserável, no qual os excessos do álcool têm uma importância fundamental para o desenrolar dos acontecimentos. Trata-se de um filme que merece ser revisitado. Ele envelheceu muito bem e nos faz refletir sobre a nossa existência: é melhor lutar até o final por suas convicções e arriscar a própria vida ou manter-se vivo e existir sem paixões?

Essa é a pergunta que Coppola nos deixa. E que cabe a cada um de nós responder.

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