Pesquisar
PATROCINADORES
PATROCINADORES

O legado de Churchill, incompreendido por olavistas e atacado pela esquerda

Arquivo histórico

A internet reserva surpresas até aos mais pessimistas. Quando alguém acha que já viu todos os absurdos possíveis na rede, vem uma nova barbaridade para elevar a régua das insanidades digitais. Ontem (17), chamou-me a atenção o nome do falecido primeiro ministro britânico Winston Churchill na lista de trending topics do Twitter no Brasil. Estava lá, no Top Ten, impávida, a hashtag Churchill.

Fui investigar o que trouxe aquele que comandou a Grã-Bretanha na luta contra o Nazismo aos assuntos mais comentados no Brasil em pleno século 21. O início de tudo foi uma “live” feita no Instagram entre um discípulo do escritor Olavo de Carvalho e dois fãs. A tese defendida: desde que o voto feminino foi permitido, a democracia está à mercê de instabilidades. A razão, segundo este raciocínio abominável, seria o fato de que as mulheres votam em quem as seduz.

O autor da teoria continuou, talvez entusiasmado pelos dois seguidores que, no quadro de cima da “live”, balançavam afirmativamente suas cabeças em resposta às frases que eram despejadas em ritmo frenético: Winston Churchill, nos dias de hoje, não seria eleito, pois sua figura não teria apelo junto ao eleitorado feminino, já que ele teria sido um beberrão e fumante inveterado de charutos. “O homem que venceu os nazistas”, ressaltou o olavista.

Em primeiro lugar, as mulheres já votavam na época em que Churchill ascendeu ao poder. As sufragettes, britânicas que lutaram para participar dos pleitos, ganharam esse direito em 1918. Portanto, tiveram influência na eleição que levou Churchill ao Parlamento inglês na época da Segunda Guerra Mundial. Mesmo assim, o voto popular nada teve a ver com sua ascensão ao governo. Ele era a principal voz de oposição a Neville Chamberlain, que estava no poder e pregava uma abordagem suave e de confiança aos nazistas. Com a queda de Chamberlain, Churchill foi o nome óbvio para liderar a nova coalizão de poder, numa estratégia de resistência e enfrentamento ao avanço de Adolf Hitler na Europa.

A segunda bobagem é acreditar que Churchill venceu a parada sozinho. Sua atuação foi importantíssima e ele pode ser considerado o símbolo máximo de oposição aos nazistas. Mas sem o exército russo, que perdeu 20 milhões de soldados durante o conflito, a vitória jamais seria obtida. O mesmo pode ser dito das forças armadas americanas, que entraram na guerra em 1941, após o bombardeio de Pearl Harbor pelos japoneses. As tropas de Franklin Delano Roosevelt recuperaram a França do domínio alemão após a invasão da Normandia, derrotaram os nazistas na Itália (com a ajuda do exército brasileiro, que tinha entre seus estrategistas o futuro presidente Humberto Castello Branco) e na África e colocaram um ponto final no conflito com as bombas atômicas que explodiram em solo japonês.

As menções descabidas a Churchill ganharam a rede e desencadearam três tipos de postagem.

A primeira, em menor volume, de apoiadores às teses levantadas na “live”.

Em seguida, mulheres inconformadas com os argumentos machistas, que as colocavam como culpadas da instabilidade política vivida pelos países.

Por fim, houve inúmeros ataques da esquerda a Churchill, minimizando sua atuação na grande guerra e exaltando a liderança de Josef Stálin à frente da antiga União Soviética no sprint final que dizimou o nazismo. Esses internautas ainda acusaram o primeiro ministro de genocida, colonialista e até de antissemita (vamos combinar que se esse último adjetivo fosse verdadeiro, Churchill iria apoiar Hitler e não lutar de forma perseverante contra os alemães).

Há um debate razoável sobre as supostas falhas de caráter de Churchill na Grã-Bretanha. Mas sua contribuição para a vitória contra os alemães, combatendo a barbárie dos nazistas e defendendo a democracia é inquestionável. O primeiro ministro tinha, sem dúvida, uma personalidade complexa e jamais poderia ser considerado um escoteiro repleto de boas intenções.

Mas, se chegamos ao século 21 sem que seu legado tenha sido completamente compreendido tanto pela direita como pela esquerda, é sinal de que seus feitos continuam na memória coletiva. Goste-se ou não, foi ele quem lançou as bases da resistência europeia ao nazismo quando pronunciou seu discurso no Parlamento e disse sua frase mais famosa: “We shall never surrender (Nós nunca nos renderemos)”. Ele rompeu com a tolerância de Chamberlain à opressão expansionista de Hitler e resolveu responder às invasões alemãs com um exército em que nada se comparava às forças teutônicas. Foi ganhando tempo para amplificar o poderio da Royal Air Force, além de ter sido responsável por de criar união entre aliados que eram como água e óleo, os Estados Unidos e a União Soviética.

Muito do que se diz negativamente sobre Churchill é na base do que “teria dito que” ou “haveria declarado que”. Sobre frases antissemitas ou racistas, há igualmente o depoimento de terceiros, nunca um registro do próprio premiê.

No decorrer da História, dificilmente encontraremos alguma personalidade imaculada, sem defeitos ou vícios, especialmente alguém que viveu o auge do poder entre as décadas de 1930 e 1950, num país conservador como a Inglaterra. Churchill não era uma figura linear e pura. Era, ao contrário, afeito aos prazeres mundanos e pródigo em falhas. Mas lutou obstinadamente pela liberdade e pelo fim às atrocidades do nazismo. Negar isso é como acreditar no terraplanismo, distorcendo fatos para se chegar à conclusão desejada.

Compartilhe

Comentários

Respostas de 2

  1. Na minha opinião , modesta ,um verdadeiro Estadista , um dos maiores homens de todos os tempos. Beberrão , fumante ,nada politicamente correto. E percebeu que Stálin , o humanista que matou de fome 7 milhões de ucranianos , estava anexando os territórios e não os libertando.

Deixe um comentário para Tex Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Pesquisar

©2017-2020 Money Report. Todos os direitos reservados. Money Report preza a qualidade da informação e atesta a apuração de todo o conteúdo produzido por sua equipe.