Conversas proibidas por rede social obtidas pela revista mostram que militar faltou com a verdade em juízo, vazou informações e foi pego em contradição

A edição da revista Veja lançada nesta quinta-feira (12) veio com a categórica manchete de capa sobre as afirmações em juízo prestadas pelo tenente-coronel Mauro Cid, principal delator da trama golpista do 8 de Janeiro e ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro: “Ele mentiu”. A afirmação surgiu do cruzamento de informações e mensagens de aplicativo trocadas por Cid e com conhecidos.
Delator que pode ter a pena reduzida por colaborar com a investigação, Cid teria mentido diante do relator do caso, o ministro do Superior Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes. Primeiro a ser ouvido na audiência de instrução conduzida com os réus do chamado Núcleo 1 da trama, na segunda (9) e na terça (10), ele foi pego em contradição – o que pode complicar sua vida. Diante de afirmações vacilantes, o defensor de Bolsonaro, Celso Vilardi, perguntou se em algum momento Cid teria usado uma conta na rede social Instagram que não estava em seu nome. O militar negou mais de uma vez. “Conhece um perfil chamado @gabrielar702?”, tentou Vilardi. Aos gaguejos, veio a resposta: “Esse perfil, eu não sei se é da minha esposa”.
Foi uma jogada da defesa do ex-presidente, que pretende desacreditar o delator. Uma estratégia óbvia neste tipo de julgamento. Algo que pode dar certo, afinal Cid teria mentido diante de todos e ao vivo pela TV. É aí que entra a apuração da revista. Conversas de Cid pelo perfil da esposa mostram que ele manteve contato com amigos depois da delação, o que era proibido.
Os jornalista tiveram acesso a trechos comprometedores de tais diálogos, ocorridos entre 29 de janeiro e 8 março de 2024, cinco meses após a assinatura da delação. Neles, Cid “fazia jogo duplo. Enquanto fornecia à PF informações sobre a movimentação antidemocrática, contava a pessoas próximas uma versão completamente diferente do caso”, afirma a reportagem.
O delator acabou por entregar a própria delação, por ingenuidade ou malícia, o que pode ter abastecido a defesa de Bolsonaro – se os jornalistas receberam o material, outros também poderiam. Nestas conversas digitais, o militar revelou o que contou nos depoimentos à Polícia Federal (PF), o que já configura crime. Também deu detalhes das audiências, das pressões sofridas e cita Alexandre de Moraes pelas iniciais AM.

Suas ações podem anular uma eventual redução de pena. Também está comprovada outra mentira. No início do audiência, Moraes alertou sobre a necessidade dele falar apenas a verdade, já que como delator não poderia sequer se valer do direito do silêncio. A seguir, pergunta se o militar fez uso de redes sociais. Diante da negativa, ficaria provado que Cid mentiu duas vezes.

A partir daí a reportagem revela uma série de críticas aos ministros do STF. Há um tom de resignação. “Eu acho que já perdemos… Os Cel PM [coronéis da Polícia Militar do Distrito Federal] vão pegar 30 anos… E depois vem para a gente”, diz. O que cria embaraço é justo a maior esperança. Cid então acreditava em anulação vinda do Congresso – anistia que agora ficaria mais constrangedora. “Só o Pacheco ou o Lira vai (sic) nos salvar [então presidentes do Senado e da Câmara]. O STF está todo comprometido. A PGR vai denunciar” – o que ocorreu.

Para um delator, nas conversas Cid se mostrou por demais leal ao chefe, Bolsonaro, que chamada de PR (presidente da República). O que não condisse com a audiência desta semana, quando admitiu que o ex-presidente reescreveu a minuta do golpe. Sobre os interrogatórios, disse ao interlocutor digital: “Eu falava que o PR não iria fazer nada”. E também dá um veredito sobre si que tem tudo para se confirmar: “Eu, Pr (sic), Heleno [Augusto, general da reserva e ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional] e BN [Braga Netto, ex-ministro dde Jair Bolsonaro e vice na sua chapa nas eleições de 2022] vamos pegar o máximo…”.
O que MR publicou