Pesquisar
PATROCINADORES
PATROCINADORES

O segundo turno que parece nunca chegar

Quando trabalhava na revista Veja, nos anos 1980, ainda utilizávamos as famigeradas máquinas de escrever e o processo de edição das matérias era muito lento. Por isso, o fechamento da revista avançava pela noite de quinta-feira e também se espalhava pela madrugada entre sexta-feira e sábado. Era muito comum irmos para casa às três da manhã de sexta, dormir algumas horas e estar de volta na redação antes do meio-dia, para uma jornada que avançaria certamente pelas primeiras horas do sábado. Por conta disso, durante os anos em que trabalhei nesta semanal, tive a impressão de que quinta e sexta eram um dia só – e interminável.

Desde o dia 2 de outubro, sinto a mesma sensação. Parece que o mês de outubro virou um dia só – uma espécie de reedição de “O Feitiço do Tempo” (“Groundhog Day”), o filme no qual Bill Murray (imagem) fica preso no mesmo dia e revive seu cotidiano inúmeras vezes. Não sei se teremos o final feliz experimentado pelos personagens da película, mas a sensação de estar amarrado ao cotidiano de um só dia é bastante forte.

Todos os dias, os jornais parecem repetir as mesmas notícias. As flutuações emocionais de Jair Bolsonaro e suas lacradas; as declarações de fundo social de Luiz Inácio Lula da Silva, que não dá nenhuma pista sobre como seria a economia em um eventual mandato; as acusações de corrupção contra os petistas e seu líder; Bolsonaro recitando seus feitos para os setores mais pobres da sociedade e os números crescentes da economia; Lula reclamando do uso da religião na campanha – e por aí vai.

Parece que aterrissamos em uma realidade paralela na qual os dias se repetem também nas redes sociais. Como não há exatamente uma quantidade grande de novas notícias, ficamos reciclando memes, xingamentos e provocações de antigamente. A coisa está tão repetitiva que os ânimos nem ficam mais acirrados. A sensação que se tem é mais de enfado e desconforto.

Para quem não fez as contas: ainda faltam dezesseis dias para que a campanha eleitoral termine. E mais algumas semanas de mimimi. Se Lula vencer, vamos ter de aguentar dias de tensão por conta do questionamento das urnas eletrônicas e, por conseguinte, do resultado; se Bolsonaro, por outro lado, vencer, teremos de discutir o efeito da máquina pública na vitória situacionista. E, qualquer que seja o resultado, as pesquisas desse segundo turno também serão colocadas na berlinda.

Um alento à repetição incessante dos acontecimentos dessa reta final de campanha pode ser o debate presidencial, marcado para o próximo domingo. Como não há mais uma plêiade de candidatos, a única saída para Lula e Bolsonaro, agora, é o confronto direto.

Nunca tivemos esse tipo de embate antes. Lula enfrentou Fernando Collor, é verdade, mas era bem mais inexperiente que agora – tinha apenas 43 anos na ocasião. Agora, tem muita quilometragem e dois mandatos presidenciais nas costas. Mesmo assim, conseguirá se concentrar e não cair nas armadilhas de Bolsonaro? Em um debate anterior, é bom lembrar, perdeu a paciência com o oponente Padre Kelmon e disse que o clérigo estava “fantasiado de padre”. Ocorrerá o mesmo no próximo domingo?

E Bolsonaro, como vai reagir às provocações do petista? Um pouco de indignação é sempre bom em uma reposta que se segue a uma pergunta marota. Mas raiva demais afugenta o eleitor. Os debates devem ser acompanhados com atenção pelo eleitorado e vão provocar um mar de discussões nas redes sociais. Essa rodada final de debates deve ser encarada como uma final de campeonato de futebol. São as últimas chances para capturar os indecisos ou os desanimados. Para isso, cada candidato irá vender a ideia que lhes cabe melhor. O ideal, porém, seria ver os proponentes levantando argumentos novos e ideias originais nestes programas de televisão. Esses conceitos inéditos poderiam atrair a atenção de quem está cansado da mesmice e da repetição. Vamos torcer para isso ocorra – ou para que o tempo passe rápido até o próximo dia 30.

Compartilhe

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Pesquisar

©2017-2020 Money Report. Todos os direitos reservados. Money Report preza a qualidade da informação e atesta a apuração de todo o conteúdo produzido por sua equipe.