O governo federal publicou, em sua página sobre o Palácio do Planalto, um texto sobre a nova diretoria da Empresa Brasileira de Comunicação. No terceiro parágrafo, uma frase chama atenção: “Rita Freire, presidente do Conselho Curador da EBC cassado após o golpe de 2016”. A nomeação da jornalista não causou controvérsia – mas sim o que estava escrito depois do nome dela: a menção de que o Conselho que Rita presidia tinha sido eliminado após o “golpe” contra Dilma Rousseff.
Essa página ( https://www.gov.br/planalto/pt-br/acompanhe-o-planalto/noticias/2023/01/nova-gestao-na-ebc-decreto-altera-diretoria-da-empresa-de-comunicacao ) passou totalmente despercebida quando foi ao ar, no dia 13. Mas, ontem, a imprensa parece ter descoberto a sua existência e o enorme potencial para criar polêmicas.
Várias discussões giraram em torno de um só tema: afinal, o impeachment de Dilma foi golpe?
Do ponto de vista jurídico, o Congresso tomou todas as precauções para que o processo corresse dentro da lei. Foi, inclusive, presidido por Ricardo Lewandowski, ministro do Supremo Tribunal Federal indicado em 2006 por Luiz Inácio Lula da Silva.
Vários juristas, porém, criticaram o motivo pelo qual Dilma foi impedida – as famigeradas pedaladas fiscais, uma ideia da ex-deputada estadual Janaína Paschoal. De fato, trata-se de um motivo pífio. Todos os governos existentes após a criação da Lei da Responsabilidade Fiscal fizeram a mesmíssima coisa, só que de formas diferente. Seria como se todos os presidentes anteriores a Dilma tivessem pedalado, só que bicicletas de marcas, modelos e cores diferentes.
Todo o processo de impeachment, porém, é político. A razão pela qual o pedido de impedimento ocorre é secundária. E, em 2016, a presidente tinha perdido completamente o apoio no Congresso, além de ter se antipatizado com deputados e senadores da base aliada. Um desses parlamentares, inclusive, chegou a dizer: “Prefiro estar na oposição com outro presidente do que ser aliado de Dilma”.
Para barrar um processo de impeachment são necessários 172 votos – ou seja, o equivalente a um terço dos parlamentares mais um sufrágio. Outra forma é evitar que haja 342 votos a favor. No caso de Dilma, apenas 137 parlamentares se colocaram do lado dela; 367 congressistas, por outro lado, votaram pela saída da presidente.
Esse placar é sintomático e mostra quão rala era a base governista. E um governo sem apoio acaba caindo de maduro.
Dilma também não pensou em outra forma de evitar o impedimento – a proximidade com o presidente da Câmara Federal. É ele quem tem a primazia de colocar um processo deste calibre para ser votado.
Antes mesmo que Eduardo Cunha fosse escolhido para a presidência da Câmara, Dilma começou a se desentender com ele. E a rixa aumentou ainda mais quando ele passou a ocupar a cadeira mais importante da Câmara. Vamos deixar de lado, por instantes, as características nefastas de Cunha, uma figura criticada por políticos de tudo quanto é corrente ideológica. Mas era dele a caneta que colocaria a bola em jogo. Brigar com ele teria sido uma jogada inteligente? Outra pergunta: se Lula estivesse aboletado no Palácio do Planalto em vez de Dilma, ele teria se desentendido com Eduardo Cunha? Dificilmente.
Dessa forma, a discussão se foi o não golpe é absolutamente inútil. Dilma fez de tudo para se distanciar do Congresso e ser derrubada por um motivo torpe. Quando isso ocorre, não há força política que possa salvar um mandatário da derrocada.