Com oportunidades camufladas em risco, aumento foi impulsionado pelas grandes usinas e gerações fotovoltaicas de pequeno porte
Por trás da volatilidade econômica está o setor de energias renováveis. E não apenas pela natureza sustentável, mas pela capacidade de atrair investimentos estratégicos em tempos de incerteza. Uma análise com mais de 20 mil operações de M&A (fusões e aquisições), realizada por Ronaldo Rodrigues, da Zaxo M&A Partners, mostra que, longe de frear o mercado, a instabilidade tem criado janelas valiosas, e o setor de energia limpa é o epicentro dessa transformação.
A pesquisa, que cruzou dados de 18 países entre 1990 e 2023, revelou que a incerteza política e econômica, embora reduza em média 6,7% o valor das transações, pode gerar ganhos expressivos quando há opções claras de crescimento no negócio. E é exatamente isso que tem acontecido com a energia solar no Brasil.
Segundo estudo da consultoria Greener, o volume de fusões e aquisições no setor solar cresceu 76% em 2024. Foram 51 transações que envolveram usinas com pelo menos 3,6 GWp de capacidade, quase o triplo do volume de 2023. Só na geração centralizada, a quantidade de deals quadruplicou.
O crescimento foi impulsionado tanto por grandes usinas (geração centralizada) quanto por sistemas de geração distribuída, como telhados solares. Na geração centralizada, foram 21 negócios de compra e venda, quatro vezes mais do que no ano anterior. Já na geração distribuída, as operações dobraram, somando 14 transações. Vários fatores contribuíram para esse aumento nas transações. A edição da Medida Provisória 1.212, pelo governo federal, que estendeu o prazo para que empreendimentos renováveis entrem em operação e garantam subsídios tarifários, estimulou transações, principalmente de projetos solares greenfield, que ainda não saíram do papel.
A busca por fontes de energia mais limpas, por parte de consumidores e empresas, tem impulsionado o mercado. A energia solar já é a segunda maior fonte da matriz elétrica brasileira, com mais de 50 GW de capacidade instalada. “A incerteza, em setores com alto potencial de crescimento como energias renováveis, deixa de ser uma barreira e passa a ser uma vantagem competitiva”, explica Ronaldo Rodrigues, senior associate da Zaxo. “Nestes contextos, investidores conseguem negociar prêmios atrativos e capturar valor futuro de forma estratégica”.
Leonardo Grisotto, sócio-fundador da Zaxo, acrescenta: “Empresas bem preparadas transformam momentos desafiadores em oportunidades. A energia renovável é um excelente exemplo: é um setor competitivo, com forte apelo ambiental e com margem para expansão em larga escala”. Jefferson Nesello, também sócio-fundador da Zaxo, reforça: “É nos momentos de instabilidade que o mercado brasileiro se torna ainda mais estratégico. Investidores com visão de longo prazo percebem que vale a pena entrar agora para colher os frutos mais adiante, principalmente em setores como o de energia limpa”.
A análise mostra que em empresas com altas growth options, isto é, com grande potencial de crescimento futuro, o impacto negativo da incerteza quase desaparece. “Em mercados mais competitivos, o prêmio pago nas aquisições pode chegar a 19%, mesmo em tempos de instabilidade”, destaca o pesquisador.
É o que o setor de energia renovável tem demonstrado na prática. O setor financeiro deve responder por 40% do volume total de fusões e aquisições no Brasil em 2025, com transações estimadas em R$ 120 bilhões, segundo projeções do banco suíço UBS BB. Parte desse movimento vem da corrida para consolidar players em geração distribuída, especialmente em regiões de alto consumo e com incentivos regulatórios. “Se há uma lição que aprendemos com o mercado global de M&A ao longo das últimas três décadas, é que a resiliência e a adaptabilidade são os maiores ativos. E, no Brasil, essas qualidades são essenciais para transformar o que muitos veem como risco em vantagem competitiva”, destaca Grisotto.