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Roque na política: esquerdistas e direitistas trocam de lugar

Nas partidas de xadrez, há uma jogada conhecida por todos os jogadores: o roque, aquele movimento que possibilita a troca de posições de peças como o Rei e a Torre. Essa imagem é bastante propícia quando imaginamos o cenário político atual. A metáfora, aliás, ganha ainda mais força quando lembramos que o mês de abril foi, quarenta anos atrás, o auge da campanha “Diretas Já”, que mobilizou milhões de pessoas pelo país e reuniões multidões significativas em São Paulo (Praça da Sé, em janeiro, e Anhangabaú, em 16/04) e no Rio de Janeiro (Candelária, em 10/04).

Quando observamos as movimentações entre esquerdistas e direitistas, parece que houve um roque na política. Parece uma conclusão estranha, mas hoje a Direita age como a Esquerda de 1984 e até levanta algumas bandeiras parecidas.

Em primeiro lugar, hoje a Esquerda está no poder e a Direita encontra-se na oposição. Em 1984, em plena ditadura militar, a situação era exatamente a oposta: direitistas no Palácio do Planalto e esquerdistas no lado contrário.

Quarenta anos atrás, quem estava nas ruas era quem protestava contra a ditadura – muita gente do Centro, é verdade, mas a maioria oriunda das esquerdas. Hoje, no entanto, quem ocupa a avenida Paulista e a praia de Copacabana é a Direita. E, nesses palanques, temos uma fórmula curiosa: políticos falando de religião e citando as escrituras sagradas, ao lado de religiosos falando de política e mencionando personagens de Brasília.

O fato, porém, é inquestionável: lideranças direitistas, como o ex-presidente Jair Bolsonaro e o pastor Silas Malafaia, conseguem mobilizar multidões, que deixam o conforto de suas casas em pleno domingo e ocupam as ruas para ouvir discursos, em eventos que duram pelo menos três horas. Já os últimos comícios de Esquerda foram um fracasso de público e de crítica.

Voltando um pouco mais no tempo: a partir de 1970, o regime militar atuou fortemente para censurar veículos de imprensa. No decreto-Lei nº 1.077, publicado em 21 de janeiro daquele ano, a censura prévia foi criada. Ou havia censores nas redações, examinando tudo o que poderia (ou não) ser publicado – ou os órgãos de comunicação tinham de consultar o governo sobre o que pretendiam divulgar.

Esse processo, porém, atingiu também as artes. Tudo passava pelo crivo da Censura Federal. Certificados eram mostrados antes da exibição de programas de televisão e de filmes no cinema. E todas as canções que seriam gravadas tinham suas letras apreciadas com antecedência. Muitas eram proibidas. Mas muitas vezes os censores eram implacáveis com compositores conhecidos e generosos com desconhecidos.

Chico Buarque de Hollanda, por exemplo, tinha problema em aprovar suas letras. Até que teve a ideia de adotar um pseudônimo (Julinho da Adelaide) que submeteu uma música (Jorge Maravilha) à Censura. A letra, aprovada na íntegra, tinha o seguinte refrão: “Você não gosta de mim/ Mas a sua filha gosta”. Alguns meses antes, a filha do presidente Ernesto Geisel, Amália Lucy, havia dado uma entrevista e listado o compositor como um de seus favoritos.

O combate à supressão de determinados conteúdos foi uma grande bandeira da Esquerda. Mas, hoje, a atuação do ministro Alexandre de Moraes contra influenciadores conservadores é taxada como censura pelos seguidores de Jair Bolsonaro (e por outros segmentos da sociedade) – e protestos em direção ao juiz são frequentes nas redes sociais.

O mesmo vale para a defesa da liberdade de expressão. Essa, no passado, era algo defendido pela oposição aos militares. Hoje, no entanto, é algo repisado pela Direita, que não se conformam com as amarras de comunicação produzidas pelo Judiciário.

Por fim, a Esquerda acusava o outro lado de autoritarismo durante o governo militar (que, de fato, proibiu eleições diretas para presidente e suprimiu liberdades individuais). Hoje, entretanto, é a Direita que acusam os oponentes de arbitrariedade (embora, neste caso, os direitistas chamam de “ditador” o ministro Moraes e não o presidente Luiz Inácio Lula da Silva).

As bolas foram trocadas e devem permanecer assim por um bom tempo, até porque os direitistas têm uma grande ferramenta nas mãos: seus heróis, calados pela Justiça, se transformam em mártires, o que pode ser muito bom para angariar a simpatia da sociedade.

Até quando teremos esse cenário? Até a polarização acabar, o que está ainda muito longe de acontecer.

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