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Lula, Gleisi Hoffman e o pecado do lucro

A Petrobras anunciou nesta semana que irá distribuir R$ 200 bilhões em dividendos relativos ao exercício de 2022. Deste montante, a União – a principal acionista da companhia – deve ficar com cerca de 29 % e o BNDES e subsidiárias com mais 8 %. Trata-se de um volume de recursos importantíssimo para o governo, que pode utilizá-los para reduzir o déficit público ou investir em projetos produtivos ou sociais.

Na situação atual do governo, todo o dinheiro é bem-vindo. Mas não é assim que pensa a presidente do PT, Glesi Hoffman. Ela postou em suas redes sociais o seguinte: “Agora é rever a indecente distribuição de dividendos da empresa para ela investir e fazer o Brasil crescer”. Ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva veio reforçar o que disse a colega de partido. “É importante dizer que as empresas brasileiras e os bancos têm que pensar primeiro nesse país para depois pensar nos seus lucros e nos seus acionistas”, disparou Lula.

As manifestações de Lula e de Gleisi nos levam a duas reflexões.

A primeira não é nenhuma novidade: para o PT, obter lucro é uma atividade pecaminosa. Quando se resolve privilegiar o acionista que acreditou na empresa, então, chegamos a um novo patamar de heresia – o pecado capital. Não importa que esses acionistas (em sua maioria, pessoas físicas e investidores institucionais) arriscaram seu dinheiro ao apoiar uma companhia que está constantemente na berlinda por conta do peso que os combustíveis têm na composição dos índices de preços. Não. O importante, para as gleisis da vida, é condenar a distribuição de lucros, usando um argumento em favor de investimentos como cortina de fumaça.

Além disso, essas declarações petistas trazem de volta uma discussão importante: a Petrobras é uma empresa de capital aberto nas bolsas de valores e, ao mesmo tempo, controlada pelo governo. De um lado, tem de remunerar seus acionistas; de outro, sofre pressões governamentais para segurar preços e não turbinar a inflação – sem contar o discurso de que a Petrobras, segundo a própria Gleisi disse em novembro, “tem de servir o povo brasileiro”. Desse jeito híbrido, ela sempre causará descontentamento. Se agradar ao PT, prejudicará os acionistas (mais de 720.000, segundo dados da CVM); se agradar os acionistas, estará enfurecendo o PT.

Talvez o melhor caminho para a empresa seja a privatização ou a estatização (com evidente vantagem para torná-la privada). Com a manutenção do modelo híbrido, porém, sempre haverá discussões intermináveis sobre o papel da Petrobras, além de hordas de insatisfeitos com sua atuação.

Na campanha eleitoral, o presidente Lula lembrou seguidamente que o Brasil é autossuficiente em produção de petróleo e, por isso, não deveria se sujeitar ao vai e vem dos mercados internacionais. Só que Lula convenientemente esqueceu de dizer duas coisas. Em primeiro lugar, o país não produz derivados, como a gasolina e o óleo diesel, em quantidades suficientes para o consumo interno. E, se operarmos com preços abaixo do mercado externo, vamos criar um rombo nas contas relativas à compra (no exterior) e à venda (no mercado interno) destes derivados. Na prática, isso seria um subsídio – e os subsídios, que nunca têm vida longa, acabam gerando uma conta a ser paga no futuro.

Voltemos à blasfêmia do lucro.

Pregar contra a margem que o empresário ganha em sua empresa é uma cantilena demagógica, mas a criação de riquezas em um país se dá através da atividade empresarial. Com esses recursos, as companhias efetuam investimentos e pagam impostos. Portanto, tudo o que vemos ao nosso redor, do asfalto de uma estrada a um prédio de apartamentos, foi construído a partir do faturamento gerado pelas empresas – ou pagando salários ou dividendos ou tributos. Como disse Margaret Thatcher, “não existe essa coisa de dinheiro público; existe apenas o dinheiro dos contribuintes”. E esses impostos são, em sua maioria, fruto de uma só fonte: a livre iniciativa.

Meu avô foi um empreendedor nato. Quando era criança, lembro de vê-lo tocando sua fundição em um terreno ao lado do casarão onde morava, no bairro da Jaqueira, em Recife. Nasceu pobre e, graças ao seu trabalho como empresário, sustentou esposa, quatro filhos e três filhas, além de dezenas de famílias de funcionários. Com mais de oitenta anos, já aposentado, abriu uma loja perto de sua casa para vender frangos e ovos (um tipo de empreendimento que os pernambucanos chamam de granja).

Tive o privilégio de passar uma tarde ao lado dele nesta granja, ajudando-o no caixa e empacotando as compras dos clientes. Testemunhei a felicidade com a qual recebia os fregueses e o esforço que ele fazia para se movimentar na lojinha, por conta de sua idade. Ao final do dia, ele pediu para que eu contasse o dinheiro que estava na máquina registradora. Disse a ele a quantia final e ele sorriu: “Hoje, o lucro foi bom. Vai dar para pagar o vale quinzenal dos funcionários de amanhã e acertar o estoque com os fornecedores”.

Para o “seu” Né, como meu avô Manuel era conhecido, o lucro era algo sagrado, não herético. Ele representa a visão de milhões de empreendedores espalhados pelo país. Já Gleisi e Lula consideram os dividendos da Petrobras “indecentes”. Daí para questionar o lucro das demais empresas é um passo – e isso não pode acontecer.

Na virada dos anos 1990 para 2000, entrevistei em Madri a CEO do Grupo Santander, Ana Patricia Botín, sobre a expansão do banco no Brasil. Ao final dessa entrevista, falamos sobre a sua alma mater, Bryn Mawr, onde estudaram a atriz Katherine Hepburn e a vencedora do Prêmio Nobel da Paz, Emily Greene Balch. E sobre sua primeira opção profissional – ela queria ser jornalista quando estudante.

Nessa conversa, discorremos também sobre a importância da iniciativa privada e de seu papel no desenvolvimento dos países. Ela, então, me disse algo inesquecível: “Lucro, criação de riqueza e competição não são palavrões, mas a força vital de uma economia dinâmica”. No dia em que Ana Botín visitar novamente o Brasil deveria marcar uma conversinha com Gleisi Hoffman. Será que isso faria a presidente do PT mudar a sua visão?

Essa é, evidentemente, uma pergunta retórica.

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